2005-07-27

#11 sentir?



Convidados em minha casa, entrem e sintam-se como em vossa casa, são livres de se banquetearem com o manjar dos deuses que está sobre a mesa, satisfaçam-se, está tudo aí para vocês!
Digo isto através da minha mascara sorridente, bem lá no fundo nenhum deles era sequer digno de pisar a alcatifa da minha sala, apenas porcos chafurdando nos belos serviços que a minha mãe comprara, bebendo dos cristalinos copos de pé alto, mastigando grotescamente os canapés, ruminando o caviar e rindo cinicamente um para os outros comentando que tudo estava divinalmente confeccionado. Nojentos e gordurosos, barrados em óleos corporais, brilhantes como vaselina liquida, e fedendo aos perfumes caros que conspurcavam cada um à sua maneira o ar precioso. Quem me dera começar a matança de uma vez e livrar a terra destes burgueses merdosos, destes pedantes rafeiros que mancham de desonra a condição humana…
O meu ser reprimido arrepia-se com tamanha lascívia, roçam-se asquerosos uns nos outros, os afrodisíacos começavam a fazer efeito e eu via-me enjoado com o abominável comportamento símio dos degenerados convidados. Quando as orgias começaram a irromper em todos os cantos escuros da grande sala palaciana já eu tinha vomitado duas vezes. Estava na hora de executar a última parte do plano, até aqui foi simples induzi-los em gula e luxúria, esses corrompidos primatas cujos órgãos sexuais controlam o discernimento. Tinham assinado a sua sentença de morte, nem mesmo depois de despoletar a engrenagem eles compreenderiam o que ia acontecer, iriam aceitar o seu destino ante o pacto que tinham com os outros seres que estavam enlaçados neles.
Subi as escadas que vinham da cave com a moto serra e despedacei corpos, pintei as paredes como um Kandinski hipoteticamente vermelho na sua fase abstraccionista lírica, e mesmo depois de mortos continuei a dissecar-lhes os corpos. Uns e outros ainda gemendo, fui desmembrando-os um a um ante os gritos arrepiantes num misto de dor e prazer para alguns, de puro histerismo para outros; foi a minha perfeita vingança para os cabrões dos meus pseudo-amigos e familiares pusilânimes, venenosos e traidores. Tudo aquilo me levou ao rubro e não, acreditem, não sou doente, simplesmente nunca tinha sentido tanto prazer e o meu corpo libertou-se em espasmos empíricos longe da minha capacidade de entendimento.
Uma vez que o meu corpo começava a libertar os nojentos fluidos e estes se misturavam com o vermelho que tingira a minha camisa branca decidi-me a limpar-me, mas antes disso tinha que contemplar aquele cenário pós-apocalíptico de líquidos espessos nas paredes e chão, de corpos semi-nús desfigurados e desmembrados, alguns gemidos ainda de ouviam abafados pela marcha fúnebre para cordas de Lutoslauski e o ar via-se tingido de fumo vermelho. E por fim, cansado, levantei-me e agarrei numa pá grande que tinha deixado providencialmente no todo das escadas e comecei a bater com ela nas cabeças que ainda libertavam sons, gostas de sangue libertavam-se kathardicamente entre cada pancada, entrei em êxtase uma vez mais quando todo o vermelho das paredes foi ainda mais intensificado por luzes vermelhas do exterior, e tornava-se progressivamente roxa e negra pelas sereias azuis, passando a roxo e a vermelho intenso uma vez mais, dando de novo lugar ao azul incessantemente.
Eu sabia que lá de fora se podia ver os cortinados vermelhos, sabia que sangue escorria por baixo da porta e lavava os degraus, decidi apresentar-me ao chamamento, abri a porta sorrindo com a pá na mão, tremendo de êxtase e ansiedade, dando gargalhadas soturnas.

perdoem-me massacrar assim um Kandinski.

O Ser Incompleto














Fome de receber, de pronunciar as palavras que tanto alcançam e dançam à minha frente sem lhes tocar.
Desejo de andar, de viajar sem medo no espaço distante, em terras longínquas e no oceano profundo.
Sede de tocar, de envolver e tecer uma teia que nos embrulhe e isole acarinhados, abraçados e intocáveis.
Vontade de desenhar um beijo e de eternamente amar, de sonhar e lutar e de ser um perfeito poeta do Mundo.

2005-07-25

#10 sentir?




Decidi não escrever, eram irrelevantes as palavras que pudesse escrever-lhe uma vez que o fruto do nosso amor jazia naquela terra azeda e seca. Lágrimas banhavam-me os seios, lavavam-me a face, tudo estava perdido, como podia eu sobreviver agora sabendo que tudo o que éramos os dois se perdera ali? Nada mais havia a dizer e ele havia de compreender o papel de carta manchado por amargas gotas de água e sal esborratando o tremule “amo-te”.
Amava-os tanto e agora um deles tinha-me abandonado, faltava-me a coragem para o enfrentar, estava farta de ser forte, não queria arriscar perdê-lo também! Não valia a pena lutar contra o inevitável; deixo assim o meu monstruoso egoísmo controlar tudo… dissolvo-me na agonia que sentia e mergulho-me na melancolia do veneno que bebi para nunca mais sentir este vazio imundo.

Do cruzar de vidas

Eles estão lá fora
Perseguem-me
Viro uma esquina e lá estão
Apoquentam-me com as suas palavras
Deixem-me viver, só quero ser Eu
Não preciso de vocês
Tocam à porta, são eles
Estou preso, não posso sair.
Socorro, alguém que me estenda uma mão
Tocam outra vez.
Apetece-me gritar, mas de que serve fugir?
Eles estão por todo o lado.
Estarei condenado a ser um deles?
Estarei condenado a segui-los?
Sou um só e eles são um todo.
Resisto, mas até quando a minha mente resistirá?

Paraíso Perdido

Um lampejo, fugaz
Revejo
Gravado algures, vivida a inocência
Recebida a resposta mordaz
Um beijo, apressado
Revivo
Perdido no tempo, sentida a ausência
A dor, a perda, o passado
Um fulgor imenso
Persiste
Errante cá dentro, magoando o ser
O sabor do cheiro intenso
O baque, arrasador
Eterno
Extinção do imortal, fim do perpétuo
Celebração e morte do amor

2005-07-21

#2 Lyrics



Like a long lonely stream
I keep runnin' towardas a dream
Movin' on, movin' on
Like a branch on a tree
I keep reachin' to be free
Movin' on, movin' on.

'Cause there's a place in the sun
Where there's hope for ev'ryone
Where my poor restless heart's gotta run.
There's a place in the sun
And before my life is done
Got to find me a place in the sun.

Like an old dusty road
I get weary from the load.
Movin' on, movin' on
Like this tired troubled earth
I've been rollin' since my birth
Movin' on, movin' on

'Cause there's a place in the sun
Where there's hope for ev'ryone
Where my poor restless heart's gotta run.
There's a place in the sun
And before my life is done
Got to find me a place in the sun.

uma mensagem de esperança para todos os que não acreditam no que virá... em especial pensado para Meriel.

música Stevie Wonder - A Place In The Sun
imagem Alphonse Mucha

Cinco minutos

Papel onde se rasgam os contornos de um beijo
Espelho do desejo, de uma alma, de um ensejo
De procurar, abrir o coração a novo fiel aliado
Para entender e suceder a um ancião desalentado
Objecto da minha deliciosa prisão, eterna e sã
Canta a minha pele, sedenta de resistência vã
Quem quer que me siga tem afecto, prazer e sabor
E corrompe, mutila e destrói o passado sem valor

2005-07-20

Da maravilha das palavras

(A Synestesis inspirou-me)


Céu azul glorioso, vento fresco
Vegetais verdes, carros azuis e beiges
Putos que correm
Batatas, couves e agriões
Roulotes, cervejas e berbigões
Nada são e existem por ser
Saudade limpa das bolotas
Na serra de nuvens laranjas
No relance de um cão e das hortaliças
E no absorver expelindo o retirado
Ceifar casas pelas raízes e os aviões
Que voam no chão perto das baratas
E eu penso para comigo
“Que mundo verde!”


(Acho que pode ser melhorado!)

2005-07-18

#9 sentir?

São a ausência de ser, a sua longa sobrevivência é dura por aquilo que não conseguem alcançar. Uma superficial subsistência vidrada nos lamentos de outros que ao contrário deles tudo viveram e acabaram por sucumbir aos seus perversos beijos dilacerantes. São eles que tudo rasgam para que se sintam felizes, aqueles que canibalizam um espírito pelo prazer que só assim podem atingir. O temor abre esta terra ante os pés daqueles vagabundos sanguessugas, aqueles que absorvem a vida, a vivência, a alegria… e os pobres que conseguiram erguer-se e viver a inquieta plenitude, vêm a iminente queda por aquilo que perdem para os vorazes predadores de almas… lânguidos e desprezíveis, autênticos usurpadores, cativam um ser e devoram-lhes as entranhas numa alucinada aspiração de sentidos até que nada mais se ouça dos lábios dos flagelados. Foram amputados pela sua curiosidade e vaidade e assim se perderam, foram no engodo e tornaram-se o regalo.

Da frustação do ser

Tão longe e tão perto
Frases feitas que fazem sentido
Não a consigo alcançar,
Ela está perto de mim e algo nos separa
Algo transparente, algo quase etéreo
Nunca a terei, nunca teremos o prazer do consumo mútuo
A sublime glória da partilha.
Nunca a sentirei nas minhas mãos, fora dos invólucros que a sociedade impõe
Mirá-la-ei com avidez de quem deseja,
Mas ela escapa-se, segura-se por um fio de cabelo, nada mais.
E fico só.

2005-07-17

Momento: Os Velhos

O grupo de anciãos, de cabeças baixas e vozes grossas, forma um círculo no meio da aldeia. As mulheres olham-nos e depositam neles a sua fé e o seu destino. Acreditam que deles depende o futuro. Os anciãos permanecem de mãos dadas e rezam. A correr, surge uma criança. Dirige-se para o círculo formado pelos velhos. As mulheres olham para a criança, surpreendidas pela ousadia. Ninguém deve interromper os anciãos! A criança continua até ao centro do círculo. Os anciãos interrompem a sua reza e, um a um, olham para o rapaz. O mais velho aponta-lhe o dedo e diz-lhe que não pode estar entre eles. São os mais velhos que decidem, são os mais velhos que sabem. A criança, assustada, apanha o berlinde que tinha rolado até ali e volta para a sua casa. Os velhos retomam a sua reza. São eles que sabem, são eles que decidem o futuro daqueles que um dia os hão-de enterrar.

O desenho é de Domenichino e foi recolhida de http://spaightwoodgalleries.com/

2005-07-15

#9 hotel

Via o escuro lá fora entre as pancadas na minha cabeça, cada vez que a perna da cadeira esmagava a minha face saltavam gotas de sangue, tudo me sabia ao mesmo, ao sangue quente. Já não sentia nada além de uma dor prolongada e aguda, na qual se misturavam todas as minhas sensações, sendo assim só uma. O meu corpo não respondia, só os meus olhos se mexiam dolorosamente nas orbitas e a minha imagem de tudo era distorcida a vermelho. Finalmente vi-lhe os olhos caírem na realidade e perderem a voracidade, caiu no chão e começou a soluçar e largou a perna da cadeira e ficou a olhar para os meus restos… como a dor era forte, mesmo sem compreender o que me doía… custava-me respirar e sentia frio nos pés e nas mãos, a cabeça fervia e o sangue que escorria aquecia-me o pescoço. Por fim ela levantou-se, cambaleou e saltou o meu corpo, ouvi o trinco da porta atrás de mim e os passos dela afastarem-se entre lamentos, fiquei ali sozinho a contemplar aqueles instantes de profunda agonia, até naquele momento tinha que estar só. Perguntava-me como seria possível que ninguém tivesse vindo à procura da fonte daqueles gritos? Provavelmente era normal… aquele era de facto o local ideal para assassinar alguém, cada um estava concentrado no seu prazer, e os gritos que se ouvissem podia ser assumidos como parte de um jogo embriagante. Nada mais podia fazer senão entregar-me aos confins da minha mente, nem os meus dedos respondiam, dei-me então ao luxo de esfregar-me neste romance de faca e alguidar...

Momento: Jangada

A lua ilumina a nossa jangada. A terra não se encontra à vista. Apenas mar a toda a volta. A temperatura está amena. O barulho das ondas suaves a embater na jangada junta-se ao dos nossos beijos. O Mundo conspira por nós. As estrelas cantam connosco. Nós somos apenas um. Aqui, nesta embarcação e longe de tudo, só tu existes para mim e só nós existimos para o Mundo. O Mar leva-nos e vamos estar sempre assim, abraçados na jangada, longe de tudo, de todos, sem frio, sem tristeza. Eternamente, seremos apenas um.

2005-07-13

Momento: Alta Velocidade

O carro a alta velocidade, a praia à nossa espera. O Sol brilha, a sua luz incide no meu braço que se encontra do lado de fora da janela. As duas raparigas que seguem no banco de trás riem-se. Eu olho para a morena e devolvo-lhe o sorriso e o brilho que ela tem no olhar. O carro a alta velocidade, a paixão à nossa espera na praia. Olho para o meu companheiro. Parece confiante e feliz. Cantamos e seguimos o nosso caminho; mil destinos nos aguardam, mil experiências, mil surpresas. O carro a alta velocidade e a emoção do futuro incerto. A morena coloca uma mão no meu ombro. Eu coloco a minha mão na dela e acaricio-a. Os nossos dedos entrelaçam-se. Até que um grito se solta da sua garganta, os seus dedos esmagam os meus e algo me esmaga as pernas. O carro está imóvel, a praia continua à espera, a paixão permanecerá por desvendar e o futuro não conta connosco.

2005-07-08

#8 hotel

Sem mais tracei uma linha vermelha na goela de Daniela, parecia manteiga e deixei-a cair de bruços no chão, ouvi um guinchinho atrás de mim, rapidamente a alcatifa creme ganhou um tom vermelho escuro. O veludo vermelho quente espalhava-se suavemente como azeite em água, sem nunca se misturarem. Olhei para trás e lá estava ela, nua, bela, tremendo como uma cana ao vento, o seu cabelo negro corria-lhe sobre o peito, tinha a mão direita atrás das costas e outra na parede. “Vais viver com as nossas mortes na consciência?” perguntou a medo… tive que satisfazer o último desejo de uma moribunda e acabei por proferir: “Sem remorsos!”, ergui a navalha e aproximei-me dela, finalmente pareceu aceitar o seu destino, esbocei um sorriso dissimulado e perverso. Sem imaginar o que se me reservava, vi o braço dela sair de trás das suas costas, cortar o ar com uma perna de cadeira na mão e acertar-me em cheio na face esquerda. Girei sobre mim e caí de joelhos no chão a poucos centímetros daquilo que fora Daniela. Sem mais senti outra pancada na cabeça, e outra e outra e comecei a perder a conta das vezes que me acertava. Sentia a minha cabeça como apêndice de carne mastigada no meu corpo, o sangue escorria por todo o lado, e ela continuava a bater-me, estava à espera que o meu corpo deixasse de responder, as suas pancadas estavam cada vez mais fracas, devia estar cansada, mas não parava. Parecia-me que ela estava a exorcizar o seu desejo de magoar alguém, uma fera soltou-se nela, mesmo sendo uma fera cansada… era ódio… estava a consumi-la, estava a destruir-me.

2005-07-06

#7 hotel

Comecei a sentir sangue escorrer-me na boca, e meu corpo indolente começava a despertar, em vez de proteger a face com as mãos suportei a dor dando a cara ao espancamento e levei as minhas mãos ao frágil pescoço de Daniela. Não estava correcto que ela me batesse… ali eu desempenhava os desígnios do senhor. Com as minhas mãos fazendo pressão no seu pescoço ela começou a desesperar, cravou-me as unhas na testa e arrancou-me carne, era a minha dor misturada com os gritos da outra. Daniela acabou por me acertar num ponto vulnerável assim que eu me virei para cima dela, ajoelhou-me maquiavelicamente, aquela dor não suportava, dobrei-me instintivamente sobre mim e caí como pedra no chão. A outra parou de gritar ao ver que Daniela tinha levado a melhor sobre mim, Daniela por sua vez recuperava o fôlego… e eu que estive a centímetros de lhe unir a traqueia irreparavelmente. Vi desfocadamente Daniela levantar-se e agarrar uma cadeira, a única que existia no quarto, comecei a arrastar-me na direcção oposta da minha atacante, não por medo mas porque era lá que estava a minha navalha. Assim que ela se encontrava em cima de mim virei-me de costas no chão, antes que me acertasse nas costas, senti uma dor aguda na omoplata e ouvi o som de madeira a partir, senti o som percorrer-me os ossos, mas não vacilei, levei a navalha ao calcanhar de Daniela e cortei-lhe o tendão, acto imediato ela caiu de joelhos no chão, antes que ela tivesse tempo de compreender o que se passava levantei-me e pus-lhe as mãos nos cabelos puxando-lhe a cabeça para trás e olhei para a outra que estava atrás de mim.

Da essência do Nada

#6 hotel

Serviço de quartos? Aquela espelunca tinha serviço de quartos? Mas como? Era ridículo… ainda por cima ia obrigar-me a falar, a situação enervou-me. A minha voz soou rouca; “Não queremos nada, pode ir embora.”, “Mas senhor… você pediu champanhe!”a voz soou abstracta e baralhada,“Já disse que pode ir embora.”, “Mas…”. Olhei para ela, estava espantada e de repente viu-se que perdera o medo para o que eu previa, abriu a boca: “SOCORRO, AJUDE-ME, ELE VAI MATAR-ME!”, incrível, que descaramento! Porque não podia uma pessoa aceitar o seu destino mansamente? Tinham sempre que dar trabalho ao enviado? Ela estava a aborrecer-me, abri a porta, levei a mão ao pescoço da empregada e puxei-a para dentro… ora que chatice, divertimento a dobrar! “Daniela! … estamos perdidas!” o quê…? Mas ela esperava a Daniela e não o Tiago? Isto era demasiada informação de uma só vez… mas ele tinha-me dito… ou não, eu é que pressupus que ela o esperava a ele e que ele não ia aparecer para que eu pudesse tratar do assunto sem problemas. Não interessava, agora tinha que acabar com aquilo. Empunhei a navalha com convicção, o trabalho seria simples, tratar de dois corpos à volta dos 55kg não era dificuldade. Em cima da cama a primeira começou a gritar e a bater com as mãos na parede “SOCORRO! ALGUÉM NOS AJUDE!”… e a segunda, fez algo que eu não previa… chutou-me a navalha da mão enquanto estava distraído a olhar para a sua amante, a coisa não estava a correr bem, e por fim senti uma massa derrubar-me e começar a esmurrar-me...

Da laranja

Os produtos hortícolas e fruta são os alimentos que devem ocupar o maior volume alimentar diário. As frutas em geral são nutricionalmente ricas de fibra vegetal, vitaminas e minerais, nutrientes protectores e reguladores.

A laranja é particularmente rica em vitamina C e em pectina, uma das fracções da fibra vegetal, importante na regulação dos valores de colesterol. Acresce também, o benefício de oferecer intacto o seu valor nutritivo, dado que se come sempre crua.

A laranja algarvia aufere ainda de notáveis propriedades, decorrentes do facto de ser sempre consumida como produto fresco e da época, e de ser proveniente duma região bastante exposta ao Sol, o que lhe confere uma maior riqueza em vitamina C.

Assim, é aconselhável o consumo de pelo menos uma laranja por dia, garante do aporte da dose diária recomendada de vitamina C, bem como de quantidade razoável de um dos melhores reguladores dos valores do colesterol.

Composição Nutricional (por 100 gramas)

Energia
Kcal
42

Kj
176

Hidratos de carbono (g)
8,5

Gordura (g)
0,6

Proteínas (g)
0,7

Vitamina C (mg)
60

2005-07-05

#5 hotel

Ensaiei imediatamente uma cena de sexo vibrante sobre os lençóis roçados, eu e ela enrolados em infinitos espasmos de prazer. Varri a imagem da minha mente que se contorcia face ao corpo inquisidor curvado e desnudado… por momentos fiquei sem saber que fazer, o que não era normal… encostei a porta até ouvir o click distinto da fechadura, “Que faz aqui? Saia!”. Obviamente a minha última acção indicava que tencionava ficar. Os olhos dela arregalaram-se, inclinou-se para o telefone, eu apressei-me a antecedê-la e arranquei-o da parede. Ela ficou pasmada e contorceu-se de pânico, levantou-se e virou-me as costas, correu para a porta, o meu braço circundou-lhe a cintura nua e atirou-a para cima da cama… tinha que despachar aquilo. De pé, à frente da porta, enquanto ela se encolhia a um canto da cama e ponderava todas as escapatórias possíveis, eu meti a mão no bolso interior da gabardina, eu adivinhava o seu cérebro a trabalhar “O que está aqui a fazer?” perguntou-me ela já num acto desesperado, “Eu vou gritar, estas paredes finas não o deixarão passar despercebido!... Responda-me pelo menos!”, a voz dela começava a esganiçar-se, como o lamento último de uma alma perdida, o seu fim parecia-lhe aproximar-se a uma velocidade única até que ao ver o que eu tinha na mão começou a soluçar “… não… deixe-me viver! Eu não fiz mal a ninguém! O que foi que lhe fiz?... Eu não tenho nada consigo! Que prazer cruel é esse?”. Abri a navalha de barbeiro, o meu instrumento predilecto, dei um passo em direcção à cama e fui abruptamente parado por três pancadas na minha retaguarda, o som da madeira vibrou e seguidamente uma voz; “Serviço de quartos.”.

2005-07-04

Da existência

Não consigo.
Não consigo saciar a fome.
Beber o suco da vida.
Rasgar a pele dos homens e sentir o quente
O espírito que lhes corre nas veias correr pelos meus lábios
Um torpor varre-me, destrói-me.
Não me consigo mexer, fico no escuro a ver o tempo passar
Desejo, sei o que quero e não consigo ter.
Horror de eternidade.
Parado no nada, sendo nada, nunca conseguindo Ser.

2005-07-02

#4 hotel

Ela saiu do carro suavemente, olhou em volta e trancou-o. Abandonou o Volvo à sua sorte e encaminhou-se singelamente para a entrada do hotel enquanto vestia o blaser. Parecia uma garça, esbelta e branca, dançando insinuadoramente a saia fluida, cortou-me a respiração… fiquei quedo a vinte metros do hotel observando-a entrar, até que a minha atenção foi quebrada por um buzinar impaciente. Encostei-me a uma ombreira torta de uma casa abandonada cujo telhado há muito já era, cuspi a pastilha e acendi mais um cigarro –tinha tempo, ou melhor queria comprá-lo. Bafejei calmamente tentando varrer da minha mente a delgada figura que vira há pouco enquanto desenhava o quadro que se seguiria. Retomei a custo a caminhada. Passei o guichet apertado no átrio limitado por umas escadas que ficavam à frente da entrada e a porta à direita que dava para uma casa de banho apertada. O balcão não tinha mais de metro e meio e do lado de dentro havia um velho pensionista que me olhava por cima dos óculos curioso, reparando que eu comecei a subir as escadas perdeu o interesse e mergulhou no jornal. O quarto era o mesmo do costume, 213. Subi quatro lanços de escada sem pressa e virei-me para um corredor sinistro, encostei-me à esquerda e caminhei silenciosamente enquanto roçava o dedo na parede rosa velho. Os meus passos não se ouviam na alcatifa vermelha suja e via as portas sucederem-se à direita, a 5, a 6, a 7… cada uma acompanhada por um ruído característico de animais. Finalmente a 13, coloquei a mão na maçaneta e girei-a, ouviu-se o trinco ceder e entrei vigorosamente. Seguiu-se silêncio e o seu rasgar por uma voz feminina: “Quem és tu?”.

2005-07-01

#8 sentir?



atrevo-me orgulhosamente a citar Ar Pútrido Cristalizado e escolher esta imagem para acompanhar o dito.

"antes fosse um monstro/o mal é uma porta para o absoluto/mas o diabo não quer nada comigo/e eu não quero nada com deus."

Dirty Train

O bandido foi projectado e caiu inconsciente no chão, após embater violentamente na parede. Virei-me para os restantes.
Entreolharam-se, indecisos. Estavam em desvantagem numérica, pois eram apenas três contra mim. Mas um deles lá decidiu avançar, com uma faca em punho. Tentou atingir-me na barriga, mas com dois golpes perfeitos atingi-o na mão e a face. Três segundos depois juntava-se ao primeiro companheiro. A faca tilintou ruidosamente ao cair no chão.
A última metade do grupo hesitou, mas ao fim de uns segundos avançou. Dois mânfios juntos dão, certamente, mais algum trabalho do que um só. Após perder um autocarro, ter sido quase atropelado por um táxi descontrolado e ser alvo da antipatia da mulher que me vendeu o jornal, já não tinha paciência para eles.
Saquei então da minha Magnum .44, até então a repousar no meu bolso interior do casaco. Despachei o assunto sujando o mínimo possível a carruagem, já de si imunda. Os restantes passageiros começaram então a aplaudir efusivamente, à medida que o comboio abrandava para parar na estação da Damaia.

Acordei sobressaltado. Ainda estava a chegar à estação de Benfica. O comboio parou e diversas pessoas entraram e saíram na habitual azáfama diária. Foi nessa altura que reparei em quatro homens de ar suspeito, encostados a um canto e a observar discretamente a carruagem. Passei a minha mão para dentro do casaco e suspirei de alívio ao acariciar a minha Magnum .44...

A fé dos homens

Era uma vez uma menina chamada Glória, que fazia juz ao seu nome, muito bonita, inteligente e culta.
Um dia na vila onde morava abriu uma loja de souvenirs hippies e ocultismo, daquelas que vendem artesanato peruano fabricado na china.
Claro que a Glória curiosa como era, decidiu investigar a loja.
A dona da loja, de antepassados ciganos, viu na Glória um enorme potencial, e falou com a moça, contou-lhe histórias e a Glória gostava de falar com esta mulher, sábia e de conhecimentos aparentemente ilimitados.
Um dia, ofereceu á Glória uma pulseira de protecção, com uma bonita rima, em latim.
Nessa noite a Glória foi sair com os amigos e quando voltavam de noite a Xica, a melhor amiga da Glória pediu-lhe para ler o que lá estava escrito. E a Glória que nutria uma amor grande (e esquisito) pela Xica leu.
Logo os céus escureceram e ribombaram, o vento levantou-se e uivou, a terra tremeu.
Apareceu a velha desgrenhada e a rir, “Finalmente !!! Caos e anarquia!!”
Que se passou? – Gritou a Glória, enquanto os seus amigos fugiam assustados.
“Quem dissesse essa mantra por amor libertava o ódio na terra.”
Zombies surgiram, homens e mulheres putrefactos, gritavam horrores, perseguiam os vivos, gemiam por carne fresca e ódio aos vivos.
Cães decompostos corriam atrás de gatos vivos e mortos, deviam cremar os animais de estimação.
Um canário zombie arrastava uma asa, a outra já tinha desaparecido.
Um Zombie arrastava as pernas bambas, paraplégico na vida, paraplégico na morte.
Uma gato zombie comeu o canário, mas este caiu no chão um pouco mastigado, o gato não tinha abdómen.
Na sequência disto um bebe zombie chorava e agarrava as mulheres todas, um homem era comido por 4 zombies.
Demónios surgiram do céu, do chão e de dentro dos humanos.
Zombies laceravam os corpos dos vivos por todos os lados, gritos, caos, súplicas, gemidos mortos, pânico e caos.
Mas eis que surge uma luz do céu, pura e brilhante, e ouve-se uma voz “Parem lá com isso. Esta história não era de série B. Raio!!”
E a paz e a harmonia voltaram. E a Glória safou-se de levar uma tareia dos pais.

É por estas e outras que é bom existir Deus e acreditar nele.

#3 hotel

Era sem dúvida a tarde de verão mais insensível da minha história, metamorfoseava-se no que queria sem se preocupar no que parecia, uma Sra. tarde perversa e caprichosa, que se alterava para mim enquanto eu matava o tempo… esperava aquele Volvo metalizado, igual a tantos outros. Finalmente a chuva cessa, fora passageira… e enquanto do asfalto se libertam os vapores da evaporação do breve aguaceiro atiro para bem longe a beata gasta. Impaciente levo a mão ao bolso e puxo as chiclettes de menta. Dos carros vêm-se sair hóspedes para todos os gostos, forasteiros fugazes procurando satisfazer os seus desejos libidinosos, chegavam a sair cinco indivíduos de cada veiculo, podia ser apenas negócios. Mas negócios, arrastando três mulheres de mini-saia era no mínimo suspeito. Igualmente suspeito eram os homens que entravam aos pares… ou as mulheres… num hotel reles de confim de mundo, que poderiam ir fazer? Queria acreditar que eram inocências, mas não, já nada se comparava a isso, era algo que havia morrido com a puberdade. Mais um carro cinza passava e eu limpava cuidadosamente as lentes dos óculos, mas depois de tanto esperar e saltitar de pé em pé para não ficar dormente, chegou finalmente o Volvo esperado. Iniciei lentamente a minha marcha, calculava cuidadosamente onde colocar os pés desviando-me das poças de água na berma, as minhas solas batiam ruidosamente no chão, era o compasso do destino que me levava à porta do Hotel…