2005-10-11

Fêmea


Será que ser mulher implica gostar de cor-de-rosa, ver novelas, pintar os lábios de vermelho, perder tempo em cabeleireiros, dizer palavras como “imenso”, “giríssimo” e “parvo”, passar horas a falar de roupa e homens, fazer trejeitos infantis com a boca e gestos dengosos com as mãos?!
Quando uma mulher gosta de animais em vez de actores de cinema, de livros em vez de revistas, de motas em vez de descapotáveis, de artes marciais em vez de ballet, de armas em vez de telemóveis, de subir montanhas em vez de passear em centros comerciais, de tiro em vez de compras, de preto em vez de cor-de-rosa, de Whisky puro em vez de Baileys, de mato em vez de betão, de bifanas no pão em vez de saladinhas, de mar em vez de piscina, é logo catalogada como “um gajo porreiro”.
Porquê que uma mulher não pode ser macia nas formas e firme no carácter? Porquê que não pode ser quente no beijo mas fria na batalha? Porquê que não pode ser fraca nos sentimentos mas forte no intelecto? Porquê que não pode ser desvairada no amor e coerente nas convicções?
Sempre tentei pensar e viver intensamente todas as descobertas do conhecimento, do amor e da vida.
Sinto-me muito feminina, muito mulher, muito fêmea.
Ser fêmea é ser feroz, é ser livre, é ser docemente selvagem.

2005-10-03

Da vida


O Trabalho rotineiro, sempre a mesma coisa, estou farto do chefe a moer-me o juízo, “Vê lá se andas com isso”, “A linha não pode parar”.
Os colegas parvos, gozões, deixem-me da mão, não me sei dar com vocês, não quero saber dos vossos futebois, carros e gajas, é só isso que existe?


A tampa da Vanda, consigo convidar alguém para sair e sou recusado, mais sou gozado por todos, “Vê lá que ele convidou a Vanda para sair”, “A sério? Hahahah”, as gargalhadas, mais uma vez gozam-me, a frieza dela, “Deixa estar que tenho muito que fazer no resto da minha vida toda”. Estou farto das mulheres farto dos homens.


A puta com quem perdi a virgindade, só assim é que conseguia, não consigo falar com elas, nunca me sai bem. Ao menos ela foi compreensiva, ela percebeu e ajudou-me, acho que nunca ninguém gostou de mim como ela.
Valeu o dinheiro.


A adolescência, putos gozões, má sorte ser gordo e com borbulhas, odeio-os a todos, 5 anos que destroem uma vida, sempre havia a Rita, era simpática e quase tão feia como eu, até falava bem com ela.


Os pais que não me ligavam, toda a minha vida estive sozinho, farto do mundo, farto de os ver e de mandarem á cara que era inútil, que com tanta gente no mundo logo lhes tinha de calhar este filho, porra não me fizessem, desapareçam.


A Rita, eu falava com ela, que será feito dela? E acho que ela gostava de mim, devia ter tentado algo mais com ela, eu também gostava dela, porque é que não tentei?


Podia ter tido outro emprego, devia ter procurado, mas não procurei, porquê?
Devia arriscar mais, mas tenho vergonha, sou tímido, destruíram a minha personalidade.
Mas eu tenho personalidade? Não sei, não a descobri, devia tê-la descoberto.
Devia encontrá-la.


Devo arriscar, devo tentar mudar, devo tentar viver, nunca tentei.
Nunca tentei.
Mas porquê?

Rés-do-chão